Endovélico era um deus da Idade do Ferro de medicina e segurança, de caráter simultaneamente solar e ctônico, venerado na Lusitânia pré-romana. Depois da invasão romana, o seu culto espalhou-se pela maioria do Império Romano, subsistindo por meio de sua identificação com Esculápio ou Asclépio, mas manteve-se sempre mais popular na Península Ibérica, mais propriamente nas províncias romanas da Lusitânia e Bética.
Endovélico tem um templo em São Miguel da Mota no Alentejo em Portugal, e existem numerosas inscrições e ex-votos dedicados a ele no Museu Etnológico de Lisboa. O culto de Endóvelico sobreviveu até ao século V, até que o cristianismo se espalhou na região.
Mesmo sem nunca ter ouvido os conselhos musicais de António Variações, Stephen Cooper mudou de vida. Hoje chama-se Pema ou Lótus e é a mensageira de Bahuchar Mata, a deusa dos eunucos indianos.
Os fiéis que enchem os templos na cidade de Becharaji, no noroeste do país procuram a sua bênção e tratam-no carinhosamente por Ma – diminutivo da sua deusa protectora. Segundo consta, os eunucos tentam assim tornarem-se homens completos numa próxima vida.
Cooper a quem foi diagnosticada uma desordem psicológica de género, gosta de usar um sari (saia típica indiana) e ser tratado como uma mulher, dai o nome com que se rebatizou: Pema. E neste momento ocupa o seu lugar no politeísmo indiano, ao lado de deuses míticos como Ganesh, Shiva, ou Kali.
Os dias desta deusa recente são passados nos pátios exteriores dos templos, onde Cooper, vestido como uma mulher indiana, de brincos no nariz e orelhas, abençoa os devotos que se amontoam em seu redor.
Deusa tatuada
Depois de não ter conseguido entrar no curso de Direito em Oxford, o inglês residente em Londres, resolveu arriscar uma carreira como fotógrafo e desenhador «freelancer».
Pouco depois, chegava à Índia e a sua vida mudaria radicalmente. “Eu nunca me senti ligado a nada e embora durante as minhas viagens me tenha cruzado com várias imagens de deuses Hindus, foi quando vi Bahuchar Mata que a sua energia me inundou de uma maneira completamente diferente”.
Foi nessa altura que Cooper, aconselhado também por outras pessoas, decidiu visitar Becharaji. O fascínio foi imediato e de tal maneira intenso que o homem prestes a tornar-se uma deusa, resolveu tatuar a imagem da protectora dos eunucos no seu braço esquerdo. Um acto de devoção que lhe custou 100 mil rupias, o equivalente a 1.500 euros.
Aparentemente, deve ter valido a pena, pois Pema foi a grande protagonista da última feira, realizada sempre que há Lua cheia. Nessa noite abençoou milhares de eunucos, uma experiência que não esquece. “As pessoas têm sido muito delicadas. Elas tocam os meus pés e eu toco-lhes na cabeça e sinto o amor e a alegria – puro e imaculado”, recorda.
Contudo, as autoridades indianas não distinguem divindades entre os comuns mortais pelo que a renovação do visto de turista, válido por seis meses, terá de ser a prioridade desta deusa. “Ficarei até me sentir bem-vindo. Talvez até ao fim da minha vida”.
Pema lava a roupa
Na região de Gujarat, há apenas um mês, Pema faz por se integrar e tenta aprender a falar o idioma local. Neste momento, o domínio do Gujarati não lhe permite dizer mais do que frases de ocasião como: “Kem cho” (Como está?) ou “Chai levu che” (Eu quero tomar chá).
Pema confidenciou que quer aprender Sânscrito e Gujarati, para conseguir ler mais sobre Bahuchar Mata e toda a mitologia Hindu. Meta que ainda está longe de ser atingida, mas nada que uma deusa com um visto renovado não consiga.
“Ele é muito discreto. Nós não sabemos inglês e ele não fala nem Hindi, nem Gujarati”, lamenta Gunwant Joshi, um dos encarregados do templo. “Ele fala apenas através de monossílabos e senta-se tranquilamente no templo a falar com as pessoas”.
Não se pense que a vida de uma deusa na Índia é faustosa ou opulenta à semelhança do que se passava com os seus colegas gregos e romanos. Pema está a viver no dormitório do templo e todo o dinheiro vindo da fé dos eunucos, segue directamente para o fundo que gere o complexo religioso.
As experiências mundanas desta deusa com problemas terrenos vão ainda mais longe. “Eu lavo a minha própria roupa”, garante orgulhosa. Algumas das refeições toma-as na casa das muitas pessoas que a convidam e garantiu ser uma fã devota de “Ladoo”, um doce local.
As únicas queixas, deixa-as aos meios de comunicação, em especial à BBC e às cadeias de televisão indianas, pela forma com a têm retratado. Mas não guarda rancor: “A Índia é um imenso coração e Becharaji é o seu centro”.
PC Raval, outro dos encarregados do templo onde Pema procede às bênçãos, assegura que “é um motivo para se ter orgulho quando alguém de outra fé encontra amparo na nossa religião e quer ficar connosco para o resto da sua vida”.